Adeus
Já gastámos
as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos
ficou não chega
para
afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos
tudo menos o silêncio.
Gastámos os
olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as
mão à força de as apertarmos,
gastámos o
relógio e as pedras das esquinas
em esperas
inúteis.
Meto as
mãos nas algibeiras
e não
encontro nada.
Antigamente
tínhamos tanto para dar um ao outro!
Era como se
todas as coisas fossem minhas:
quanto mais
te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu
dizias: os teus olhos são peixes verdes!
e eu
acreditava.
Acreditava,
porque ao
teu lado
todas as
coisas eram possíveis.
Mas isso
era no tempo dos segredos,
no tempo em
que o teu corpo era um aquário,
no tempo em
que os meus olhos
eram peixes
verdes.
Hoje são
apenas os meus olhos.
É pouco,
mas é verdade,
uns olhos
como todos os outros.
Já gastámos
as palavras.
Quando
agora digo: meu amor...,
já se não
passa absolutamente nada.
E no
entanto, antes das palavras gastas,
tenho a
certeza
de que
todas as coisas estremeciam
só de
murmurar o teu nome
no silêncio
do meu coração.
Não temos
já nada para dar.
Dentro de
ti
não há nada
que me peça água.
O passado é
inútil como um trapo.
E já te
disse: as palavras estão gastas.
Adeus.
Eugénio de
Andrade
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